Nos primórdios da era 16-bit, Street Fighter II bombava nas casas da arcade do mundo todo. A vontade de todo moleque da época era ter um Super Nintendo com o game para jogar em casa.
E aqueles que não tinham o poderoso console, tinha que se contentar em comprar mais e mais fichas no arcade.
Mesmo que existissem muito mais NES no mundo do que SNES, a Capcom jamais imaginou uma conversão de Street Fighter II para o console, já que ele não teria capacidade de reproduzir a complexidade do jogo.
Bom, na verdade, saiu aquele tenebroso jogo de plataforma de nome “Street Fighter 2010 – The Final Fight” que nada tem a ver com o jogo de luta e nem merece ser lembrado. Afinal, o que falar de um ciborgue de nome Ken, que vive no “futurista” ano de 2010 onde ele derrota robôs malignos?
Enfim, SFII nunca viria para o NES se não existissem os jogos clones piratas. E não estou me referindo às cópias piratas de jogos originais, estou falando daqueles criados do zero, que traziam títulos inéditos para o console.
Criado por uma tal de Yoko Soft (uma empresa japonesa?), “Street Fighter 2” chegou ao NES trazendo apenas 4 personagens: Ryu, Chunli, Zangief, Guile, e como vilão não selecionável,o poderoso e escrito de forma errada “Viga”.
Muitos outros clones de Street Fighter II saíram para NES, no entanto, esse SFII e o SFIII (com 8 personagens) são os mais famosos.
Eu tive um desses e se não me falha a memória, era uma versão que vinha num cartucho de 72 pinos, embalagem preta e uma foto do Ryu, Guile, Zangief e ….Ken. O nome do jogo era Master Fighter II, com o nome Yoko soft alterado para Xoxo soft (ou seja, pirata do pirata).
Durante a febre dos jogos de luta, esse SFII serviu de quebra galho. Eu, por exemplo, não tive muitos jogos e costumava ir à locadora nos fins de semana (quase sempre). Então, aprender todos os truques com os 4 personagens jogáveis foi algo inevitável.
Como o NES tem apenas dois botões de “disparo” havia apenas um soco e um chute. Os controles respondiam bem e existiam até mesmo os comandos para executar os “poderes” dos personagens. Mesmo assim, para fazer um shoryuken é quase impossível, porque é necessário que se faça muito rapidamente a sequência e você não pode errar nenhum comando do direcional. Por outro lado, golpes que necessitariam de carregamento, como o Spinning Bird Kick da Chun-li, podem ser feitos rapidamente, sem esperar os 2 segundos do primeiro movimento.
A jogabilidade não é nada parecida com o arcade, no entanto, é concisa e dá para aprender a jogar numa boa. Não que não existam erros, eles estão lá, embora não atrapalhem muito.
Golpes que deveriam empurrar você ou o oponente para trás, empurram para o lado errado dependendo da posição dos lutadores. Há um meio de prender o inimigo no canto da tela e ficar no esquema “voadora, rasteira, espera meio segundo, voadora, rasteira…” e continuando assim até vencer a luta. Isso funciona até com o Viga! Essa “manha” facilita muito para chegar ao fim do jogo, só não é legal ficar usando num amigo que esteja jogando com você, afinal, não há defesa contra isso.
Caso não queira roubar com o truque do canto da tela, ainda há como vencer os oponentes, basta decorar que reação eles tem a cada movimento que você faz, para encontrar uma brecha e contra-atacar. Para ficar mais arcade, o jogo tem apenas 2 continues para usar. Isso não é tão ruim, para um jogo que só tem 4 lutas mesmo.
Os sons são engraçados. Não existem falas, mas alguns ruídos os subistituem. O “Round 1 Fight!” é um belo exemplo disso. Os golpes especiais possuem barulhos também, enquanto o Tatsumaki Senpuu Kyaku do Ryu faz um ruído constante e irritantemente alto (parecendo que o jogo travou), o Spinning Bird Kick da Chun Li parece uma metralhadora. Os demais golpes soam como uma explosão: “DOOOM”.
Algumas músicas são incrivelmente fiéis ao jogo original. O tema da Chun Li e do Ryu foram bem convertidos para o jogo, assim como o da tela de seleção de personagem, da tela de versus e da abertura. Já as músicas do final do jogo e os temas do Zangief, Guile e Viga são totalmente originais. Destaque para a música dos créditos que é bem composta e até mesmo grudenta.
Você me pergunta: “Abertura?”. É isso mesmo, apesar de ter sprites estáticos, o jogo possui abertura como no arcade, em que vemos uma briga entre dois personagens do Street Fighter I, então a tela sobre e mostra o topo do prédio ao fundo ( Chupa Super Nintendo! O NES tem abertura!).
E pasmem! Existe até final no game. Sabe tela do final do Ryu, em que ele aparece andando numa estrada? Pois essa tela serve de final para os outros personagens, só que ninguém se mexe. Porém, há um texto dizendo o que acontece com cada um dos lutadores após o torneio.
Zangief por exemplo fica famoso no mundo da luta livre americana e cria um estilo próprio de arte marcial. “Engrishes” acontecem em todos os textos e não posso dizer que não é engraçado encontrá-los.
Com o tempo, versões modificadas desse jogo foram surgindo, cada vez mais bizarras. A mais estranha que já encontrei pela internet é o Mario Fighter II com “12 peoples” (isso mesmo, people com “s”). Há a versão com uns personagens totalmente novos, outras com o Rambo, ou misturando franquias e também as que repetiam a foto do lutador na tela de seleção para aparentar ter mais “peoples” para escolher.
Esses hacks eram bem injogáveis e feitos de qualquer jeito. Com sprites esticados, mal acabados, com cores erradas e músicas repetidas. Era raro sair algo que fosse completo e aceitável como os Street Fighters II e III, ou o jogo Kart Fighters (que tinha os personagens do Super Mario Kart, mas era de luta, não haviam karts e eu nunca entendi esse nome… enfim…).
Por sorte dos gamers, a geração 16-bit foi ficando mais popular e os consoles baixando de preço. Assim, não era preciso correr atrás desses jogos clones para matar a vontade de jogar Street Fighter ou outros jogos de luta. Os jogos clones se tornaram bem raros na época dos 16-bit e praticamente desapareceram na geração seguinte.
Nos dias atuais, desenvolvedoras menores tem um reconhecimento bem maior, graça à popularização dos indie games. É bom ver as fabricantes de console e a Valve apoiando essa ideia. Assim, as pequenas desenvolvedoras podem trabalhar de forma legal, sem a necessidade de recorrer à personagens protegidos por copyright como algumas faziam no passado.
(Não… eu não estou dizendo que empresas indies são iguais a empresas que criavam clones piratas no passado. Estou apenas dizendo que hoje em dia tornou-se mais fácil a produção de jogos, mesmo para quem tem pouco orçamento para produzir.)
Alugava o cartucho desse jogo na locadora que tinha perto de casa, cansei de zera-lo.